sexta-feira, 29 de maio de 2009

QUANDO A SEDE VAI EMBORA


A última gota se foi, esvaziou-se a taça. O pretexto de um drink se esvaiu e, com ele, acabou a sede entre os pares. Beber o quê? Só restou uma taça vazia.

SILÊNCIO SEPULCRAL


No silêncio da necrópole, tudo é significativo. A fala, por ser temporal, concede espaço à reflexão. Por aqui, lidamos com índices vários: seja de benquerança, de opulência, de aniquilamento físico... mas lidamos também com o refazimento da vida, não às escâncaras, mas sob uma discrição da natureza, que compartilha da luz do sol, da água das chuvas e da refrigeração da brisa para dar continuidade aos ciclos da vida, mesmo em um espaço aparentemente morto.

GIRASSÓIS SEM VAN GOGH



Ah, Van Gogh, se pudesse ver o quanto dos seus girassóis se tornaram mais radiantes do que os próprios modelos vivos, não teria dado tanta atenção às gralhas em sua derradeira tela. Hoje, também, os girassóis continuam belos, porém menos vivos nas pinceladas de outros pintores. Não bastam o esboço da flor e o apuro das tintas; faltam-lhes emoção, o instante de uma poesia que era exclusivamente seu, Vincent Van Gogh. Talvez Theo, seu irmão, fosse o único a ter olhos de ver o que está além da técnica. Tentamos agora, em vão, recuperar a presença desse olhar e só conseguimos tingir de amarelo nossas expectativas. No máximo, um girassol com menos vida.

UM SUGESTIVO SABOR

Seria tão previsível expor a imagem de uma xícara contendo café... No seu lugar, prefiro atiçar os sentidos com os signos linguísticos, traçados, de maneira sugestivamente artesanal, sob uma malha áspera, rude, que nos remete aos sacos de linhagem das zonas portuárias. Basta perceber as tramas da malha para despertar o gosto e o cheiro de uma agradável dose de café, através da memória. Uma experiência, merece ressalva, inesquecível para quem sabe colher da cafeína bons momentos de prazer.

quinta-feira, 28 de maio de 2009

SOB A REGÊNCIA DOS ASTROS

"Abro o jornal só para ler o calendário/Você é de Peixes/Por coincidência, eu sou de Aquário/Horóscopo me dá todo mês para o amor/Meu signo é você/O azul é a nossa cor..." (Horóscopo, Mário Donato-Heitor Carillo)

SELVA URBANA




Na selva de pedra em que vivemos, os espigões verticalizam a minha ambição. E, neles, meu espírito é puro aço e concreto. Não construo sentimentos, tão-somente uma redoma de itens funcionais e vidros espelhados. Sou mais um selvagem dessa selva.

EM PÉ NA ESTRADA

À beira do caminho, muitas vezes nos encontramos. Às vezes, perdemos a noção de distância em relação ao nosso companheiro de jornada. Às vezes, caminhamos em círculo e não chegamos a lugar nenhum. Outras vezes, aceleramos o passo e permanecemos solitários na estrada, só expostos ao calor, à poeira e ao vento. Se nos sentimos crianças no percurso, ficamos sem saber para onde seguir. Se contamos com a companhia de um mascote, torna-se amena a dor de caminhar só, embora a estrada permaneça o que é, sem importar-se com as bolhas nos pés do caminheiro.
Foto de Alexander Kharianov, disponível no site 1000 Imagens.

DESTINO: LÉGUAS SUBMARINAS


Desejo literário incontido em percorrer a paisagem submarina a bordo do Nautilus...

PERCURSOS DE UM JORNAL IMPRESSO

Como esquecer do dia em que visitei as dependências de um jornal impresso? Ao circular pela redação, vem à mente a disposição de dominó para as carteiras de trabalho e o trânsito contínuo dos funcionários, à semelhança de uma colméia humana. Para quem convive à margem do processo, desconhece a emoção de assistir à preparação, ainda com indícios artesanais, do produto final, que é a matriz de impressão do jornal. Se Nara Leão pudesse falar, acompanharia, com olhar atento e ávido, a edição em que informa, aos telespectadores, programa em sua homenagem.
Foto: Christiano Britto

REFLEXÃO À BEIRA-MAR


"Mas pra que tanto céu?/Mas pra que tanto mar?/Pra quê?/De que serve a onda que quebra no meio da tarde?" (Inútil paisagem, Tom Jobim-Aloysio de Oliveira)

quinta-feira, 14 de maio de 2009

DILEMA DO "TIC-TAC"


"Mera ilusão auditiva graças à qual a gente ouve sempre 'tic-tac' e nunca 'tac-tic'... Depois disso, como acreditar nos relógios? Ou na gente?"(Mário Quintana)

O tempo é mais uma convenção humana, dentre tantas, com a diferença que provoca em nós efeitos curiosos e diversos. Tentamos ao longo da vida correr a favor do tempo cronológico e nunca contra ele, sob pena de assistirmos, impassíveis, à dinâmica da vida, sem direito a uma segunda chance. Por isso o tempo é "o senhor da razão" e não nos concede a retomada do passado. Desde cedo, passamos a conhecer o estranho contrato que se estabeleceu entre a entidade tempo e os nossos corpos. Envelhecer é algo inexorável para todos nós e não há meios de evitar a sua passagem, mas, em nosso íntimo, o "tac-tic" de que se refere Quintana ganha outro sentido de tempo e outra percepção de contagem. Nesse espaço, damo-nos conta de conviver não apenas com ilusões auditivas, mas também de nos rendermos às forças de um tempo que só mede a si mesmo.
P.S.: não consegui identificar a autoria da foto. Mas o crédito dela será dado tão logo se pronuncie o seu autor.

INSPIRAÇÃO GREGORIANA


"Pequei, Senhor; mas não porque hei pecado,

Da vossa alta clemência me despido;

Porque, quanto mais tenho delinquido,

Vos tenho a perdoar mais empenhado."

(Gregório de Mattos, A Jesus Cristo Nosso Senhor)
Errar faz parte da natureza humana e bem sabia disso Gregório de Mattos, o Boca do Inferno. Admiti-los era até possível, mas, submetê-los à remissão de sua culpa frente a Jesus no madeiro, é outra história para o polêmico poeta. Em tom provocativo, Gregório desafia a divindade a perdoá-lo indefinidamente. Só assim, para ele, teria o ônus da prova quanto à misericórida divina. Uma provocação semiótica interessante é constatar o quão internalizado está os ícones que se remetem à divindade e os seus efeitos sobre os praticantes da fé cristã. Convidar religosos a exercitarem o diálogo proposto pelo Boca do Inferno seria uma heresia descabida para os valores previamente eleitos para expressar religiosidade e, sobretudo, para externar a comunhão com Deus. Curioso observar, em tais instantes, a sugestão de pequenez frente ao impacto do crucifixo ou de uma imagem religiosa. Com propriedade, o fotográfo Francisco Mendes captou a sugestão de redenção que o Cristo e o madeiro despertam nas pessoas. Numa interpretação mais surreal, o madeiro evocaria a imagem de uma nave rumo às paragens celestiais, disponíveis apenas aos que já se despiram dos seus pecados - principal exigência para os viajores.

QUAL É A PRÓXIMA JOGADA, PARCEIRO?




Diz-se que o xadrez aguça a inteligência dos seus jogadores e também estimula, neles, a concentração e a habilidade tática. Pode até ser que vivamos sob um tabuleiro de xadrez e nos sintamos a estratégia em pessoa . Convenhamos que ninguém gosta de sentir o peso do "xeque-mate" em seu espaço. Muitos sabem o que é viver como "peão" e conviver, paradoxalmente, com "reis", "rainhas" e "torres" de marfim - figuras, na verdade, apáticas, que estão circunscritas aos contos de fada, aos naipes do baralho e à imaginação de candidatos à realeza. No máximo, eles só sabem dar ordem e viver nas nuvens.
No lugar de aceitarmos a polaridade preto x branco no dia-a-dia, melhor seria transitarmos por aí, com liberdade, sem nos limitarmos a fronteiras bicolores. Colheríamos bons intercâmbios e sairíamos de um foco enxadrista.

quarta-feira, 13 de maio de 2009

COM OS PÉS NA ESTRADA


Sei que estou em atraso com vocês, amigos internautas. Mas convenhamos que as incumbências de um estudante de Jornalismo são quase heróicas, nesse cotidiano acelerado. Pudera eu balançar por aí no estilo cabeça-de-teia, mas a minha forma física não o permite. Mesmo na ausência de dotes extraordinários, consigo dar os meus pulinhos e, com alguma sorte e muita transpiração, ter algum êxito, principalmente nos afazeres acadêmicos. Agora, este blog passa por uma transição de disciplina. Peço licença a querida Tânia Motta e entra em cena a professora Suzane Costa, com suas aulas de Semiótica. É chegado o momento de trilhar alguns corredores, alguns arbóreos, outros sombrios, outros luminosos, uma transitividade total. Para tanto, percepção aguçada.